“Chibata!” e a consciência dos Direitos Humanos

Por Eliezer Rodrigues

 

E enquanto se discute a militarização das favelas cariocas com a instalação de UPPs, no dia 20 de novembro é celebrado o Dia da Consciência Negra, data em que Zumbi dos Palmares morreu, um dia para se refletir a inserção do negro na sociedade brasileira.

 

Mas cerca de 101 anos atrás, no dia 22 de novembro, eclodiu uma rebelião de cunho racial no Rio de Janeiro que ficou conhecida como a Revolta da Chibata. Foi uma das muitas revoltas que marcaram o primeiro período republicano no país. Entretanto, o que choca sobre esta revolta são as razões que a deflagraram e o seu trágico desfecho.

 

Como boa parte da Marinha brasileira era composta por oficiais negros e mulatos, subordinados a um oficialato de origem branca e elitista, os castigos em caso de indisciplina eram bastante semelhantes aos usados durante o período escravista.

 

Com o descontentamento geral, os marinheiros já articulavam uma revolta para dez dias depois da posse da presidência de Hermes da Fonseca; porém, devido a uma punição de 250 chibatas contra um dos marinheiros, os revoltosos precipitaram o motim e em 22 de novembro tomaram o Encouraçado Minas Gerais. Ainda na mesma noite, outros navios foram tomados pelos marinheiros rebeldes sob a liderança de João Cândido Felisberto.

 

E com os canhões apontados para o Rio de Janeiro, os amotinados conseguiram um acordo com o Governo Federal. Contudo, assim que se entregaram, sofreram represálias de todos os tipos, desde expulsão da Marinha até execuções e internações em hospitais psiquiátricos. Quase cem anos depois do fim da perseguição e repressão aos revoltosos, o governo brasileiro concedeu uma anistia simbólica e inscreveram João Cândido no Livro dos Heróis da Pátria.

 

Em 2007, de olho no mercado de adaptações sobre fatos históricos, a editora Conrad pediu para que os cearenses Olindo Gatelha (texto) e Hemetério (desenhos) ficcionalizassem a revolta liderada por João Cândido: Chibata! João Cândido e a revolta que abalou o Brasil (Editora Conrad, 2008).

 

Ainda que tenham feito um trabalho de viés ficcional, não faltou material de pesquisa para dar a base histórica à trama. Em entrevista à revista O Grito, de outubro de 2008, Hemetério afirma que tiveram muito cui­dado para ambi­en­tar a HQ o mais corretamente pos­sí­vel. “Sou arqui­teto, então as par­tes do roteiro envol­vendo cenas de rua e mobi­liá­rio urbano foram par­ti­cu­lar­mente inte­res­san­tes pra mim”, alega o desenhista.

 

 

Mas a pesquisa não se restringiu à criação e ambientação. Momentos como a tomada do navio e uma página que referencia a estética do Barão de Itararé mostram a força artística do roteiro e da arte para retratar um momento bastante crítico da História do Brasil – que durante muitos anos tornou-se tabu para os militares brasileiros. O jogo de luz/sombras e hachuras só potencializa o realismo da trama e, consequentemente, aumenta a carga dramática da obra.

 

Mais do que discutir a questão do negro na sociedade, inevitavelmente, Chibata! discute a forma como poder público tem lidado historicamente com questões delicadas de cunho político e social. Mais do que dar Unidade Pacificadoras, mais do que desocupar reitorias ou evitar que supostos inimigos do Estado bombardeiem a capital federal, o governo teria a função de zelar pelo bem maior de sua nação: o seu povo. O que só é alcançado nas regras de um jogo onde prevaleceria o diálogo democrático.

 

Quer saber mais?

 

Revista O Grito: “Chibata!”

Uol Educação: Revolta da Chibata

Folha de S.Paulo: “Em ano de anistia, Revolta da Chibata ganha HQ”






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